Há 50 anos, Jânio Quadros saía da presidência, após uma passagem curta
Há meio século, Jânio da Silva Quadros se tornou o primeiro presidente
eleito pelo voto do povo a renunciar ao posto máximo do país. Após o ato
surpreendente, o ex-presidente “passou três décadas tentando explicar a
renúncia”, que jogou o país numa crise política que quase antecipou o
golpe de 1964, como escreveu o historiador Marco Antonio Villa, para a “Folha de S. Paulo” desta quinta-feira, em que se lembra os 50 anos da saída de cena de Jânio.
A crise, aliás, era já esperada por Jânio, que, inclusive, contava com
ela para voltar ao poder – segundo a versão mais aceita pela
historiografia, e que é repetida por seu neto em artigo também para a “Folha” desta
quinta-feira. Jânio Quadros Neto afirma que seu avô era tinha uma
“personalidade misteriosa, histriônica, surpreendente”, que geralmente
agia “com ironia ou agressividade intelectual” às perguntas sobre as
suas razões para sair do poder. Apenas em 1991, já no fim da vida do
ex-presidente, que seu neto diz ter tido coragem de tocar no assunto.
“Aqueles que os deuses querem destruir, eles primeiro os fazem
presidentes do Brasil”, teria respondido o avô a seu neto de quase mesmo
nome. “Quando assumi a Presidência, não sabia a verdadeira situação
político-financeira do país. A renúncia era para ter sido uma
articulação, nunca imaginei que ela seria de fato executada. Imaginei
que voltaria ou permaneceria fortalecido. Foi o maior fracasso da
história republicana do Brasil, o maior erro que cometi. Esperavaum
levantamento popular e que os militares e a elite não permitissem a
posse do Jango, que era politicamente inaceitável para os setores mais
influentes da nação na época.”
A história a seguir, todos sabem: Jango, que estava em viagem à China, é
ameaçado de ser preso caso voltasse ao país. Começa uma campanha pela
legalidade, liderada por Brizola, no Sul. Após duas semanas, Jango
consegue assumir, mas com seus poderes diminuídos pela instauração de um
parlamentarismo, cujo primeiro-ministro era Tancredo Neves
Na “Revista de História da Biblioteca Nacional”, há diversos artigos que abordam a figura de Jânio Quadros. Um dos textos, “Condecorando Che”,
demonstra uma das características mais marcantes de seu governo, a
diferença entre uma política externa independente e uma política interna
conservadora. Jango “fez um governo bipolar”, como escreve Villa,
citando uma das características mais retrógradas do presidente, de
legislar sobre as liberdades individuais, chegando a proibir o biquíni.
Como prefeito de São Paulo, já no fim da carreira e após ter derrotado
“um futuro presidente da República” – como faz questão de citar seu neto
–, no caso FHC, Jânio tomou outra atitude que se intrometia nos
direitos básicos, como o ir e vir. “Em 1988, Jânio Quadros decidiu
proibir definitivamente a prática do skate em São Paulo”, anota o
historiador Leonardo Brandão, no artigo “Rodinhas duradouras”.
Por fim, a imagem que imortalizou o político.
“Os presidentes Jânio Quadros, do Brasil, e Arturo Frondizi, da
Argentina, caminham lado a lado pela cidade de Uruguaiana (RS), em plena
performance política, acompanhada por jornalistas. Surpreendido por um
ruído, Jânio se vira e é flagrado pela câmera atenta de Erno Schneider
em uma pose inusitada: cada perna parece querer ir para um lado, os pés
também indicam sentidos opostos, num desequilíbrio que sugere a
iminência de uma queda, ou de um nó”, como escreveu a professora Ana
Maria Mauad.
A foto,
“tão forte era a fotografia, e tão fiel ao momento histórico” que
“ficou para sempre associada ao personagem. (...) Aquela fotografia
jornalística sintetizava o conturbado período político por que passavam o
Brasil e o mundo. E iria além, cumprindo um papel quase premonitório.”
A premonição, infelizmente, que todos sabemos sobre o quê.
Revista de História
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